Por Tsadok Ben Derech
a) A Cabalá
Apesar de, atualmente, a Cabalá ser conhecida como o conjunto de ensinamentos esotéricos do judaísmo e do misticismo judaico, desenvolvidos a partir da Idade Média (séculos XII em diante), em um sentido mais amplo, a Cabalá significa todas as tradições e movimentos místicos do judaísmo que se desenvolveram desde o período do Segundo Templo. Então, fica claro que Yeshua e seus discípulos viveram na época em que a Cabalá se fazia pulsante, apesar de ainda não se encontrar totalmente sistematizada, tal como a concebemos hoje.
São muito antigas as raízes da Cabalá, conforme leciona o rabino James Trimm:
“De acordo com o Sefer HaTagin, Rabi Nehunia ben HaKanah, autor tradicional do Bahir[1], aprendeu alguns de seus segredos místicos de um determinado [homem chamado de] Menachem. Este Menachem é geralmente identificado com um certo Menachem, o essênio, mencionado por Josefo, que teria visto Herodes ainda criança e profetizado que um dia ele iria se tornar rei.
Assim, a tradição mística judaica conhecida como Cabalá pode ter, pelo menos, muitas de suas raízes tanto no Judaísmo essênio quanto no Judaísmo farisaico.” (The Middle Pillar: A Jewish Perspective on the Godhead, 2009, página 161).
A palavra “Cabalá” (קבלה) quer dizer, em hebraico, “recebimento”, e tem por objetivo, dentre outros, receber do ETERNO entendimento sobre assuntos sobrenaturais e místicos. Preordena-se a Cabalá a usar a sabedoria israelita para investigar a natureza do ETERNO e desvendar segredos do Universo como, por exemplo, quem é YHWH, como Ele se revela aos homens, estudo da alma, do mundo espiritual, dos anjos, dos demônios, investigação acerca do fim dos tempos etc.
Infelizmente, com o passar do tempo, muitas pessoas deturparam o significado da Cabalá legítima, transformando-a em um esoterismo pagão. Não obstante, a Cabalá é uma ciência judaica que, se utilizada de acordo com as Escrituras, poderá trazer entendimento mais elevado acerca de mistérios do ETERNO. Tanto é verdade que muitos cristãos já buscaram e conseguiram criar uma “Cabalá dentro do Cristianismo”, aplicando os conhecimentos da ciência israelita para melhor compreensão dos textos do “Novo Testamento”. Por exemplo, o cabalista cristão Giovanni Pico della Mirandola (1463-1494) chegou a dizer:
“nenhuma ciência pode melhor nos convencer da divindade de Jesus Cristo do que a Cabalá.” (Cabala, Gershom Scholem, A. Koogan editor, página 177).
Com toda propriedade, existem fortes ligações ente os escritos da B’rit Chadashá e o antigo ensino cabalístico, principalmente no que diz respeito à elohut (divindade) de Yeshua HaMashiach, que se torna facilmente compreendida por meio de profundas revelações da Cabalá.
No passado, o termo “Cabalá” era usado para designar todas as partes da Bíblia que estão fora da Torá, ou seja, os livros dos profetas e os escritos. No Talmud e na literatura pós-talmúdica, dizia respeito à Lei Oral.
No Judaísmo Antigo, a Cabalá era conhecida como “Sitrei Torá” e “Razei Torá” (ambas as expressões significam “Segredos da Torá”), ou “Torat HaSod” (Segredo da Torá). Isto é de extrema importância, visto que a Cabalá não busca apenas a interpretação literal das Escrituras, nem a exegese meramente comparativa de textos, mas antes procura os “segredos” ocultos nos textos bíblicos, que somente podem ser captados por meio de revelação do ETERNO.
Em outras palavras, existe um nível de entendimento bíblico que é alcançado pela razão, porém, a compreensão mais elevada é obtida pela revelação sobrenatural. Já que a revelação, desprovida da razão alicerçada nas Escrituras, é extremamente perigosa, pois pode induzir a graves erros, os antigos sábios sempre pensaram que a Cabalá somente poderia ser estudada por pessoas com profundo conhecimento da Torá. Caso contrário, os próprios conceitos fundamentais da Torá poderiam ser distorcidos, transformando a Cabalá em um sistema pagão. Este é o grande problema da Cabalá moderna, seguida por astros do cinema e celebridades: tais pessoas são totalmente ignorantes na Torá, razão pela qual seguem uma religião esotérica pagã e idólatra.
Repita-se: somente é útil a Cabalá àqueles que conhecem profundamente e cumprem a Torá, sob pena de adulteração das Escrituras.
Por exemplo: a Cabalá se vale de muitas metáforas e alegorias para tentar explicar o ETERNO. Este é chamado, dentre tantos nomes, de “Luz”. Se alguém tomar literalmente o termo “Luz”, pensará que o ETERNO é um “clarão”, uma energia impessoal que vaga pelo Universo, uma matéria luminosa sem inteligência e vontade. Porém, de acordo com a Torá, o ETERNO é um Ser pessoal, dotado de vontade e razão, logo, não é uma energia irracional. Em suma, chamar o ETERNO de “Luz” é um termo meramente metafórico, e não literal. Ao longo do estudo, serão apresentados inúmeros textos que deverão ser compreendidos apenas de forma alegórica, descartando-se a interpretação literal.
b) Zohar, o Livro do Esplendor
A elohut (divindade) do Mashiach não é um conceito inventado pelo Cristianismo, mas deriva das Escrituras Sagradas, inclusive possui suporte teórico na tradição do Judaísmo Antigo.
Com efeito, a obra-prima da Cabalá judaica, o Zohar, atesta que o Mashiach é uma das formas de emanação do ETERNO no mundo existente.
O Zohar, o Livro do Esplendor, é a espinha dorsal da Cabalá, e contém importante tradição oral judaica. Supostamente, Elohim teria revelado segredos da criação a Adam (Adão), que os transmitiu aos patriarcas e a Moshé (Moisés), até chegar à compilação de tais lições no Zohar, um comentário místico da Torá. Esta obra foi divulgada ao mundo no final do século XIII, na Espanha, por Moisés de Leon (1250 a 1305 D.C), dizendo este que teria reeditado um manuscrito em aramaico do século II, de autoria de Shim’on Bar Yochai.
Assim, acerca da autoria do Zohar, existem duas teses. A primeira, amplamente majoritária no meio judaico, afirma que o livro foi escrito por Shim’on Bar Yochai no século II, rezando a história que o rabino, durante a perseguição romana, teria se escondido em uma caverna por 13 anos, recebendo revelações sobrenaturais para escrever o Zohar[2]. A segunda teoria aponta que o livro foi escrito pelo próprio Moisés de Leon, que teria atribuído a autoria a Shim’on Bar Yochai apenas para dar maior credibilidade à obra, que então seria reputada de grande antiguidade e assinada por famoso rabino tanaíta[3].
Não obstante, ainda que seja admitida a autoria de Moisés de Leon, no século XIII, isto não conflita com a existência de uma antiguíssima tradição oral e escrita do Judaísmo Antigo, que culminou na edição do Zohar. Vários setores do Judaísmo reputam que o Zohar foi inspirado pelo ETERNO, revestindo-se de autoridade canônica. Escreveu Gershom Scholem:
“O livro do Zohar, a obra literária mais importante da Cabalá, (…) nenhum livro teve uma influência e um sucesso sequer aproximadamente similares ao seu. (…) uma fonte de doutrina e revelação igual em autoridade à Bíblia e ao Talmud, e com o mesmo grau canônico, o que é uma prerrogativa que não pode ser postulada por nenhuma outra obra da literatura judaica.” (apud in “O Zohar: o Livro do Esplendor”, Polar, 2010, contracapa).
Ainda que não consideremos o Zohar como canônico, cremos que contém relevantes tradições judaicas vigentes na época de Yeshua, e que eram do conhecimento dos netsarim. Com efeito, existem vários textos da B’rit Chadashá (Aliança Renovada/ “Novo Testamento”) que retratam conceitos do Zohar!!!
Verbi gratia, a B’rit Chadashá descreve que YHWH se manifesta de várias formas, principalmente por meio da emanação tríplice do Pai, do Filho e da Ruach HaKodesh. Não são três pessoas, mas sim três emanações de YHWH. Ensina o Zohar a mesma doutrina, apesar de não reconhecer expressamente que Yeshua seja o Mashiach.
c) O Ein Sof e os três Gaunin (גונין)
À luz dos ensinos da Cabalá, a essência do ETERNO, o Ser Infinito, é inacessível ao homem:
“Todos os sistemas cabalísticos têm sua origem numa distinção fundamental em relação ao problema do Divino. Em abstrato, é possível pensar em Deus seja como o Próprio Deus, apenas no que se refere à Sua própria natureza, ou como Deus em Sua relação com a Sua criação. Entretanto, todos os cabalistas concordam que nenhum conhecimento religioso de Deus, mesmo do tipo mais elevado, pode ser obtido exceto através da contemplação do relacionamento de Deus com sua criação. Deus em Si, a Essência absoluta, está além de qualquer compreensão especulativa ou mesmo extática.” (Cabala, Gershom Scholem, A. Koogan editor, 1989, página 80).
De acordo com o Livro do Esplendor, o ETERNO é chamado de “Ein Sof” (infinito, ilimitado), expressão que designa a divindade absolutamente transcendente. Eis as palavras do Zohar:
“Antes que qualquer forma tivesse sido criada, Deus estava só; sem forma e semelhante a nada. E porque o homem não é capaz de conceber Deus como Ele realmente é, não lhe é permitido representá-Lo, nem em pintura, nem por Seu Nome, nem inclusive por um ponto. Mas depois de ter criado o homem, Deus quis ser conhecido por Seus atributos, como o Deus da Misericórdia, o Deus da Justiça, o Deus Todo-Poderoso, o Deus dos Exércitos e Aquele Que É.” (O Zohar: o Livro do Esplendor, Polar, 2010, página 82).
Consoante a obra cabalística, o ETERNO é inacessível ao homem, que não pode contemplá-lo. Porém, Elohim deu forma a si mesmo durante a criação, dando origem à luz:
“Ao dar forma a Si mesmo, Deus deu vida a tudo o que existe. E ocorreu o seguinte: no princípio, o som da Palavra chocou-se com o Vazio e formou um Ponto imperceptível, a origem da Luz. Este ponto foi seu Pensamento. Do Ponto Ele evoluiu para uma forma misteriosa, que cobriu com uma veste cintilante. Esta é o Universo, que é ao mesmo tempo uma parte do Nome de Deus. Então emanaram d’Ele dez luzes que brilham na forma que tomaram d’Ele e enviam raios luminosos em todas as direções, como um farol. O Ancião[4] é um farol elevado que reconhecemos pelas luzes multiformes e brilhantes reveladas a nossos olhos. Todas as partes do Santo Nome são luzes.
(…)
O Sagrado Ponto projeta uma luz em quatro direções, e ninguém pode suportar seu brilho. Só os raios que emanam dele podem ser contemplados.” (O Zohar: o Livro do Esplendor, Polar, 2010, páginas 84 e 85).
Ensina o Zohar que o homem não contempla diretamente YHWH, mas tão somente os raios de luz que dele emanam. O ETERNO se manifesta à humanidade valendo-se de conceitos terrenos, compreensíveis aos mortais. Por conseguinte, Elohim é chamado de o Ancião dos Dias (ou Ancião), composto de três naturezas (gaunin[5]): o macho (o Pai), a fêmea (a Mãe), e o filho. São estas três naturezas alegóricas que se revelam ao mundo, e não o ETERNO em si[6], pois este habita em um mundo não existente ao homem (inacessível).
Então, o Ancião dos Dias (YHWH), também chamado de a Face Grande, cria o Universo e estende um véu para não ser acessado pelos homens, porém, estes podem contemplar a essência divina gravada no véu, que aparece sob diversas formas. Esta essência divina é chamada de a Face Pequena. Resumindo: o Ancião dos Dias (Face Grande) é o ETERNO inacessível, enquanto a Face Pequena é a emanação do ETERNO no mundo existente. O Ancião dos Dias é o princípio da manifestação divina, e corresponde à primeira vontade de Deus antes de se manifestar ao mundo (pura essência divina em si mesma). Por outro lado, a Face Pequena é Elohim se manifestando em nosso mundo, o que pode ser sentido pelos homens:
“Deus é o Mestre no manto branco e de Rosto resplandecente.
(…)
A brancura de sua Cabeça lança luz em todas as direções. Devido ao comprimento do Rosto, o Ancião dos Dias é conhecido como a Face Grande, que é composta de três naturezas ou princípios superpostos: macho, fêmea e filho. A fim de criar os mundos que só podem existir em Deus e por meio de Deus, a Face Grande estendeu um véu em frente de Si mesma, e neste véu está gravada a Essência Divina, conhecida como a Face Pequena. Em frente a esse véu estão colocados muitos outros véus…
O Ancião dos Dias e a Face Pequena são um [echad] e o mesmo. Ele é o centro de toda a perfeição. E essa é a Imagem na qual estão contidas todas as outras imagens: a imagem que pode ser vista por toda parte e em todas as formas. Mas o que vemos é tão-somente o que nós mesmos nos temos esboçado a partir das reproduções com as quais estamos familiarizados. Ninguém pode ver a Imagem autêntica e real. A reprodução que lhe é mais semelhante é a do homem.
No Mundo Superior os dois olhos formam um, e ele sempre está aberto.” (O Zohar: o Livro do Esplendor, Polar, 2010, páginas 89 a 91).
Há fortes paralelos entre o Zohar e a B’rit Chadashá. O Zohar explica que ninguém tem acesso ao Ancião dos Dias, mas este se revela por meio da Face Pequena, que é Ele mesmo, já que ambos são um. A B’rit Chadashá parte da premissa de que ninguém nunca viu a Elohim (Jo 1:18), mas este é revelado por meio do Filho (Jo 1:18), e Pai e Filho são um e o mesmo YHWH (Jo 10:30 e Cl 1:15):
“O homem jamais viu a Elohim. O Filho Unigênito, que está no seio do Pai, esse o declarou.” (Yochanan/João 1:18).
“Eu e o Pai somos um [echad].” (Yochanan/João 10:30).
“Ele [Yeshua] é a imagem visível do Elohim invisível.” (Colossayah/Colossenses 1:15).
Ou seja, Zohar e B’rit Chadashá estão falando a mesma coisa com palavras diferentes: o ETERNO, em sua plenitude, é inacessível ao homem. Não obstante, o Criador se manifesta ao mundo contraindo a sua infinitude, sendo chamado de a Face Pequena no Zohar ou de Yeshua HaMashiach na B’rit Chadashá.
Aliás, os netsarim (nazarenos) escreveram sobre três naturezas do ETERNO: Pai, Filho e Ruach HaKodesh[7] (Mt 3:16,17; 28:19; Jo 14:16,17 e 26; 15:26; II Co 13:14; Gl 4:6; Ef 2:18; II Ts 3:5; I Pe 1:2; Ef 1:3,13 e Hb 9:14).
Ruach HaKodesh é uma expressão feminina e, no manuscrito hebraico intitulado Bessorah HaIvrim (Evangelho de acordo com os Hebreus[8]), Yeshua chama a Ruach HaKodesh metaforicamente de “mãe”, dizendo que Ela o levou ao deserto para ser tentado por HaSatan (capítulo 4:1).
Aliás, o Tanach chama YHWH não só de Pai (Jr 31:8 ou Jr 31:9; Is 63:16 e 64:7 ou 64:8; Ml 1:6), como também de Mãe (Is 66:13), e ainda se refere ao Filho (Pv 30:4 e Sl 2:2, 7 e 12). Então, conclui-se que os netsarim se valeram metaforicamente da ideia de Pai (Elohim), Filho (Yeshua) e Ruach (“Mãe”). Não são três “deuses”, mas sim o mesmo e único YHWH.
De modo análogo, o Zohar giza que o ETERNO se manifesta alegoricamente como Pai, Mãe ou Filho:
“Quando Deus quis criar todas as coisas, Ele começou criando algo que era ao mesmo tempo macho e fêmea; e estes, por sua vez, Ele os fez dependentes de alguma outra forma que é ao mesmo tempo macho e fêmea.
(…)
E outra vez temos macho e fêmea: a Sabedoria é o Pai; a Inteligência, a Mãe. Esses são os dois pratos da Balança. Por causa deles, tudo se manifesta na forma de macho e fêmea. Sem a Sabedoria não haveria começo, já que a Sabedoria é o Pai dos Pais, a origem de todas as coisas. Dessa união a Fé nasce e se espalha no mundo…
Assim, Biná [Inteligência] é realmente Ben Yah, Filho de Deus, o qual é a perfeição de tudo o que existe. Quando o Pai, a Mãe e o Filho (que é a Misericórdia – Chéssed) estão juntos, há a síntese perfeita.” (O Zohar: o Livro do Esplendor, Polar, 2010, páginas 115 e 116).
Logo, a manifestação tríplice do ETERNO como Pai, Mãe e Filho no Zohar equivale à tríade emanação proposta pela B’rit Chadashá: Pai, Ruach HaKodesh (“Mãe”) e Filho (Yeshua).
Duas observações são importantes.
Primus, o ETERNO não tem sexo, razão pela qual as figuras do Zohar e da B’rit Chadashá são metafóricas. Exemplificadamente, quando Yeshua chama Elohim de Pai, não está querendo dizer que o Criador seja do sexo masculino, mas apenas se vale de uma linguagem humana para tentar expressar a natureza infinita do ETERNO. Da mesma forma, falar do aspecto “feminino” de Elohim (ex: amor) não indica a existência de sexo. Esta é a grande diferença entre o pensamento judaico e o pagão: o primeiro vislumbra os aspectos do ETERNO como meramente simbólicos, enquanto o segundo cria de forma idólatra um panteão de deuses que têm identidade sexual.
Secundus, o Zohar e a B’rit Chadashá não pregam a doutrina da Trindade, porquanto concebem o Pai, o Filho e a Ruach (Mãe) como meras emanações de 1 (um) só YHWH, e não como três Pessoas diferentes (politeísmo trinitário).
d) O mistério do “Shemá” revelado pelo Zohar
Interessante sublinhar que judeus no mundo inteiro, todos os dias, recitam a oração conhecida como “Shemá” (“Ouve”), repetindo: “Ouve, ó Yisra’el, YHWH é nosso Elohim, YHWH é um [echad]” (Devarim/Deuteronômio 6:4). Esta prece é conhecida como a profissão de fé do Judaísmo acerca da existência de 1 (um) só Elohim, que ressalta o monoteísmo: “YHWH é um (echad)”.
Ao comentar o “Shemá”, o Zohar revela um mistério, qual seja, o nome do ETERNO é mencionado 3 (três) vezes em um curto espaço:
“Ouve, ó Yisra’el, YHWH [1ª menção] é nosso Elohim [2ª menção], YHWH [3ª menção] é um” (Dt 6:4).
Questiona o Zohar: se YHWH é um, então, por que é citado três vezes? YHWH é um ou três?
Explica o livro que YHWH é um [echad], mas se revela por três “Gaunin” (essências, naturezas, substâncias, manifestações):
“A forma prescrita da oração diária [o Shemá] é para ser entendida e para ser percebida. Temos dito em muitos lugares que esta oração diária é uma das passagens concernentes à Unidade, o que é ensinado pelas Escrituras. Em Devarim [Deuteronômio] 6:4, nós lemos primeiro יהוה (YHWH), depois אלהינו (Eloheinu/nosso Elohim), e novamente יהוה (YHWH), que juntos formam uma Unidade.
Porém, como estes Três Nomes[9] podem ser UM? Será que é UM por que nós os chamamos de UM?
Como estes Três são UM somente pode ser conhecido por meio da revelação do Espírito Santo, e com os olhos fechados[10].
E este é o mistério da voz. A voz que é ouvida é apenas como UM som. E são Três GAUNIN [manifestações/essências, substâncias]: fogo, ar e água[11]. E todos estes são UM no mistério da voz.
E também aqui ‘YHWH, Eloheinu, YHWH’ são UM. Três GAUNIN que são UM. E esta é a voz do ato de um filho do homem em proclamar a Unidade. E para que ele veja a Unidade do ‘Todo’ do Ein Sof (o Ser Infinito) para o fim do ‘Todo’. Por causa da voz em que é feito, estes são Três que são UM.
E esta é a profissão diária [recitação do Shemá] da Unidade que é revelada no mistério do Espírito Santo.
E há muitos GAUNIN que são uma Unidade, e todas elas são verdadeiras, o que um faz o outro faz, e aquilo que um faz o outro faz.” (Zohar, volume II, página 43, Amsterdan Edition).
A palavra GAUNIN é sinônima de K’NUMEH, podendo ser traduzida como “essências”, “naturezas”, “substâncias” ou “manifestações”. Então, expõe o Zohar: “Três GAUNIN que são UM”, ou seja, o ETERNO é UM, mas se revela por meio de três GAUNIN/K’NUMEH (essências/naturezas/manifestações).
Retornando-se à passagem transcrita do Zohar, está escrito “o que um faz o outro faz, e aquilo que um faz o outro faz”. O que isto significa?
Esclarece o renomado rabino medieval Menachem Recanati:
“… isto é o desejo de que o ETERNO não seja separado, os três gaunin estão unidos no Senhor. Embora os atributos estejam falando no plural, qualquer dos atributos está em um e também no outro.” (apud The Great Mystery or How Can Three Be One?, Tzvi Nassi, 2010, página 20).
Em sentido análogo ministra o rabino Tsvi Nassi:
“ [Afirma o Zohar:] ‘Aquilo que um faz o outro faz’, o que é evidente da unidade que eles formam, e que não pode haver nenhuma diferença de vontade ou propósito dentre eles [os gaunin do ETERNO].” (The Great Mystery or How Can Three Be One?, 2010, página 19).
Encontra-se no Judaísmo Antigo a ideia da tríplice natureza do ETERNO, extraída da interpretação do Saltério. Com feito, giza o rabino Menachem Recanati:
“[Tehilim/Salmos 146:1-3]. ‘Deem graças a YHWH, porque ele é bom’; em seguida, ‘Deem graças ao Elohim dos elohim’; em seguida, ‘Deem graças ao Senhor dos senhores’. Ele alude com estes três nomes de Elohim por causa das três naturezas de Elohim.” (Commentary on Deuteronomy X.17, página 278, col.2, Venice Edition).
Ante todos os escólios bosquejados, ratifica-se que a antiga tradição oral judaica, compendiada no Zohar, é uníssona ao vislumbrar três essências do ETERNO, e tal conceito foi manejado pelos netsarim (nazarenos) ao lecionarem que existe apenas 1 (um) YHWH, manifestando-se pelas essências (naturezas) do Pai, do Filho e da Ruach HaKodesh.
e) Os três degraus e o Salmo 110
As três emanações do ETERNO também são chamadas de “três degraus”:
“Venha e veja o mistério da palavra יהוה [YHWH]: há três degraus, cada um existente por si; apesar disso, eles são UM, e tão unidos que não se pode separar um do outro.” (Zohar, volume III, página 65, Amsterdan edition).
Ao se debruçar sobre o tema, o rabino ortodoxo Tsvi Nassi, que passou a crer em Yeshua HaMashiach, escreveu sobre os “três degraus” descritos no Zohar:
“Os três degraus devem ser entendidos como três distintas naturezas de Elohim”.
“… os três degraus em Elohim são três naturezas unidas em uma.” (The Great Mystery or How Can Three Be One?, 2010, página 11).
Para explicar o sentido dos “três degraus”, prossegue o Zohar:
“O caminho do justo é uma luz brilhante [Pv 4:18], e sobre este relato está escrito: então tu terás prazer no Senhor. Quem é este Caminho, do qual todos os caminhos derivam de sua luz, e sobre o qual as luzes menores dependem?
Este é o Ancião [YHWH; Dn 7:13], a causa de todas as causas… Tudo o que é luz recebe a luz Dele, e é feito brilhar por meio Dele, e Ele é a altíssima e secreta luz, que não se pode conhecer[12].
O Ancião é revelado com três cabeças, que estão unidas em Uma, e esta cabeça é exaltada três vezes. O Ancião é descrito como três naturezas; e isto é porque as outras luzes que emanam Dele estão incluídas nas três [naturezas].
Sim, o Ancião é descrito como sendo dois [Dn 7:13]. Ele é a Coroa que sobre todos é exaltada; o Chefe do chefe; tão exaltado, Ele não pode ser conhecido perfeitamente.
Assim, as outras luzes são duas que completam um. Sim, é o Ancião Santo descrito e pleno como UM, e Ele é UM, certamente UM; assim são as outras luzes unidas e glorificadas em UM; porque elas são UM.” (Zohar, volume III, página 288, Amsterdan edition).
Fica patente na citação acima que o ETERNO é Um, mas possui três naturezas distintas, conhecidas como “três degraus” ou “três gaunin” (manifestações, essências, naturezas).
A ideia de que o Mashiach é uma emanação do ETERNO fica bastante clara na interpretação israelita do Livro dos Tehilim/Salmos 110, segundo a ótica do Midrash e do Zohar.
Eis o Salmo 110:
“YHWH diz a meu Senhor: ‘Senta-te na minha mão direita, até que eu faça de teus inimigos um estrado para teus pés’.
(…)
YHWH[13] pela tua mão direita despedaçará os reis no dia de sua ira.” (Tehilim/Salmos 110:1 e 5).
Explica o Midrash que tal Salmo se refere ao Mashiach:
“YHWH diz a meu Senhor: ‘Senta-te na minha mão direita [Sl 110:1]. Isto é dito para o Mashiach, e em misericórdia o trono será estabelecido.” (Midrash Tehilim sobre o Salmo 110:1).
Sobre este mesmo Salmo, comenta o Zohar:
“O Senhor disse a meu Senhor: Senta-te na minha mão direita, até que eu faça de teus inimigos um estrado para teus pés [Sl 110:1].
‘O Senhor disse a meu Senhor’: ou seja, o degrau superior [YHWH] disse para o degrau debaixo [YHWH]: ‘sente-se à minha direta’.” (Zohar 1:50b).
Consoante o comentário supra, a expressão “meu Senhor”, no Salmo 110, é uma menção ao Mashiach, chamado pelo Zohar de “degrau debaixo”, sendo certo que o Zohar considera cada “degrau” como sendo uma emanação do ETERNO. Então, a questão se torna óbvia: a) o degrau é uma manifestação do ETERNO; b) o Mashiach é chamado de degrau; c) desfecho: o Mashiach é uma das três emanações de YHWH, já que este possui três gaunin (manifestações, essências, naturezas).
f) Os Três Gaunin na B’rit Chadashá
Os Três Gaunin do ETERNO também constam da B’rit Chadashá.
Releia-se o Zohar:
“E são Três GAUNIN [ou K’NUMEH]… E todos estes são UM.” (Zohar, volume II, página 43, Amsterdan Edition).
Este conceito aparece na B’rit Chadashá, uma vez que Yochanan (João) falou expressamente sobre a k’numah[14] do Pai e a k’humah do Filho. K’numah é sinônimo de Gaun, significando “essência, natureza, manifestação, substância”. Assim, os três Gaunin do Zohar equivalem às três K’numeh da B’rit Chadashá:
Texto em aramaico de Yochanan/João 5:26:
אַיכַּנָא גֵּיר דּלַאבָא אִית חַיֵא בַּקנוּמֵה הָכַנָא יַהב אָפ לַברָא דּנֵהווּן חַיֵא בַּקנוּמֵה
Tradução:
Tal como o Pai tem vida em sua k’numah, da mesma forma deu ao Filho vida em sua k’numah.
Ou seja, a k’numah (essência, natureza, manifestação) do Pai é uma, e a k’numah do Filho é outra[15]. Unindo-as com a k’numah da Ruach, teremos três k’numeh/gaunin, referentes ao Pai, ao Filho e à Ruach (“mãe”, ou aspecto “feminino” de YHWH).
Aqueles que não estão acostumados com os mistérios da Torá poderão se surpreender com o fato de o ETERNO ser tratado com um aspecto feminino. Porém, esta concepção é bíblica. Senão vejamos.
Instrui a Torá que Elohim é eterno (Dt 33:27), inferindo-se daí que é um Ser Infinito e que existe antes da criação do tempo, do espaço e da matéria. No misticismo[16] judaico, YHWH é chamado de Ein Sof (אין סוף), que literalmente quer dizer “não há fim, não há definição”, isto é, o ETERNO é impassível de ser definido e compreendido por nossas mentes limitadas. Ein Sof geralmente é traduzido como Ser Infinito.
Pois bem, se YHWH não pode ser definido, como será possível explicá-lo? Como desvendar o infinito para a finita razão humana?
Para resolver este problema, o Tanach usa de conceitos terrenos para explicar as questões espirituais elevadas. Já que nós, meros humanos, sabemos o que significa a figura do Pai, da Mãe e do Filho (este resultante da união dos dois primeiros), então, as Escrituras alegoricamente tratam Elohim como sendo os três. Se alguém achar que o ETERNO é literalmente homem ou mulher, estará raciocinando em termos pagãos. À luz do pensamento judaico, os aspectos femininos e masculinos são meras ilustrações alegóricas de um Ser Infinito que é impassível de definição.
g) O Pai, a Mãe e o Filho
Figurativamente, o Tanach menciona YHWH como Pai:
“… porque sou um Pai para Yisra’el…” (Yirmeyahu/Jeremias 31:8; versões cristãs: Jr 31:9).
“O filho honra o pai, e o servo o seu senhor; se eu sou Pai, onde está a minha honra? E, se eu sou Senhor, onde está o meu temor? diz YHWH dos Exércitos a vós, ó sacerdotes, que desprezais o meu nome.” (Mal’achi/Malaquias 1:6).
“Mas tu és nosso Pai, ainda que Avraham [Abraão] não nos conhece, e Yisra’el não nos reconhece; tu, ó YHWH, és nosso Pai; nosso Redentor desde a antiguidade é o teu nome.” (Yeshayahu/Isaías 63:16).
“Mas agora, ó YHWH, tu és nosso Pai; nós o barro e tu o nosso oleiro; e todos nós a obra das tuas mãos.” (Yeshayahu/Isaías 64:8).
Os últimos textos acima citados são de Yeshayahu (Isaías). Recebeu o profeta não só a revelação de que o ETERNO é como se fosse um Pai, como também de que YHWH é visto alegoricamente como Mãe:
“Como alguém confortado [ou consolado] pela Mãe, eu os confortarei [consolarei]; em Yerushalayim [Jerusalém], vocês serão confortados [consolados].” (Yeshayahu/Isaías 66:13).
Perceba que o ETERNO diz que irá consolar o povo tal como uma Mãe. Na B’rit Chadashá, quem aparece como o “Consolador” é a Ruach HaKodesh, que é uma expressão que possui duplo gênero (masculino e feminino). Raciocinemos: a) o consolo provém da Mãe (Is 66:13); b) quem irá consolar é a Ruach HaKodesh; c) logo, a Ruach HaKodesh é vista figurativamente como sendo uma Mãe.
Nos Manuscritos em aramaico da B’rit Chadashá, a Ruach HaKodesh aparece com flexões verbais e adjetivos ora no masculino e ora no feminino, inclusive é chamada de “Ela”.
RUACH NO MASCULINO:
מָא דֵּין דֵּאתָא פַּרַקלִטָא הַו דֵּאנָא משַׁדַּר אנָא לכוּן מֵן לוָת אָבי רוּחָא דַּשׁרָרָא הַו דּמֵן לוָת אָבי נָפֵק הוּ נַסהֵד עלַי
“Mas, quando vier o Consolador, que eu da parte do Pai vos hei de enviar, aquele Ruach [Espírito] de verdade, que procede do Pai, ele [masc.] testificará de mim.” (Yochanan/João 15:26).
וֵאנָא אֵבעֵא מֵן אָבי וַאחרִנָא פַּרַקלִטָא נֵתֵּל לכוּן דּנֵהוֵא עַמכוּן לעָלַם
“E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Consolador [masc.], para que fique convosco para sempre.” (Yochanan/João 14:16).
RUACH NO FEMININO:
והִי רוּחָא מַסהדָא לרוּחַן דּאִיתַין בּנַיָא דַּאלָהָא
“E ELA, a Ruach [fem.], testifica em nosso espírito que nós somos filhos de Elohim.” (Ruhomayah/Romanos 8:16).
ומֵחדָא דַּסלֵק מֵן מַיָא חזָא דֵּאסתּדֵקו שׁמַיָא ורוּחָא אַיכ יַונָא דּנֵחתַּת עלַוהי
“Assim que saiu da água, Yeshua viu o céu aberto e a Ruach descendo [fem.] sobre ele como uma pomba.” (Yochanan Marcus/Marcos 1:10).
Eis uma lista de outras passagens em que a Ruach é mencionada por meio de verbos ou outras flexões no feminino, consoante os manuscritos em aramaico: Jo 1:32, 33; 6:63; 7:39; Atos 8:29, 39; Rm 8:9,10,11,16, 26; I Co 3:16; I Tm 4:1; I Pe 1:11; 4:14 e I Jo 5:6.
Logo, a manifestação do ETERNO na figura de uma “Mãe” que consola (Is 66:13) equivale ao conceito feminino de Ruach HaKodesh exposto na B’rit Chadashá. A Ruach HaKodesh é o ETERNO retratado alegoricamente como “Mãe”.
É esclarecedor o manuscrito aramaico de Lucas:
הוָא דֵּין כַּד עמַד כֻּלֵה עַמָא וָאפ יֵשׁוּע עמַד וכַד מצַלֵא אֵתפּתַחו שׁמַיָא
ונֵחתַּת רוּחָא דּקוּדשָׁא עלַוהי בַּדמוּת גּוּשׁמָא דּיַונָא וקָלָא הוָא מֵן שׁמַיָא דָּאמַר אַנתּ הוּ בֵּרי חַבִּיבָא דּבָכ אֵצטבִית
“Sucedeu que, quando todas as pessoas foram imersas [“batizadas”], Yeshua também foi imerso e, enquanto ele orava o céu se abriu;
E ELA, a Ruach HaKodesh, desceu sobre ele como uma pomba, e uma voz do céu dizia: Tu és o meu Filho amado, em quem me comprazo.” (Lucas 3:21-22).
Valendo-se do Evangelho dos Nazarenos em hebraico, que recebeu diretamente dos nazarenos, o “Pai da Igreja” Jerônimo ensinou que, na passagem acima, foi o próprio Espírito Santo (Ruach HaKodesh) quem disse: “Tu és meu Filho amado”[17]. Então, segundo a versão daquele Manuscrito, deduz-se que “Ela” (Ruach HaKodesh) é a “Mãe” quem chama Yeshua de Filho.
A Ruach HaKodesh não é uma força impessoal, mas sim a própria pessoa de YHWH:
“Como o rebanho que desce ao vale,
a Ruach [Espírito] de YHWH deu-lhes descanso.
Assim conduziste teu povo, para fazer a ti mesmo um nome glorioso.” (Yeshayahu/Isaías 63:14).
“A Ruach [Espírito] de YHWH falou por mim, e a sua palavra está na minha boca.” (Sh’mu’el Beit/2ª Samuel 23:2).
“A Ruach de YHWH está sobre mim, pois YHWH ungiu-me para anunciar as boas novas aos pobres…” (Yeshayahu/Isaías 61:1).
“Elohim é Ruach [Espírito]…” (Yochanan/João 4:24).
Pelo fato de a Ruach HaKodesh ser YHWH, possui personalidade: Ela tem pensamento (Rm 8:27); vontade (I Co 12:11) e sentimento (Ef 4:30). E mais: Ela revela e guia (II Pe 1:21); ensina (Jo 14:26); clama (Gl 4:6); auxilia (Rm 8:26); fala (Ap 2:7); ordena (At 16:6,7); testemunha (Jo 15:26); pode se entristecer (Ef 4:30); não aceita mentira (At 5:3); não se pode blasfemar contra a Ruach (Mt 12:31,32). São aplicados à Ruach HaKodesh atributos exclusivos de YHWH, quais sejam, eternidade, onipresença, onipotência e onisciência (Hb 9:14; Sl 139:7-10; Lc 1:35; I Co 2:10-11), além de ser o Criador (Gn 1:2).
Por fim, YHWH também é retratado no Tanach como sendo o Filho:
“Por que as nações se tumultuam e o povo se lamenta em vão?
Os reis da terra estão posicionando-se, os líderes conspiram juntos contra YHWH e seu Mashiach.
(…)
Eu mesmo [YHWH] consagrei Meu Rei[18] em Tsion [Sião], meu santo monte.
Proclamarei o decreto:
YHWH me disse: Tu és meu filho; hoje me tornei seu Pai.
Pede-me, e farei das nações tua herança; o mundo inteiro te pertencerá.
(…)
Sirvam a YHWH com temor; alegrem-se, mas com temor.
Beijem o Filho, para que não se ire, e vocês pereçam pelo caminho, quando repentinamente sua ira se acender.
Abençoados são aqueles que nele se refugiam.” (Tehilim/Salmos 2:1,2,6-8,11 e 12).
“Quem subiu ao céu e desceu? Quem encerrou os ventos nos seus punhos? Quem amarrou as águas numa roupa? Quem estabeleceu todas as extremidades da terra? Qual é o seu nome? E qual é o nome de Seu Filho, se é que o sabes?” (Mishlei/Provérbios 30:4)
Ao se ler os textos acima, aparentemente há 2 (duas) pessoas mencionadas: o Criador de todas as coisas e Seu Filho. O pensamento pagão tende a considerar, de fato, que existem “dois deuses”, ou “um deus superior” e “um deus inferior”. Contudo, de acordo com a Cabalá judaica, a expressão “Filho” se refere à emanação do ETERNO, e não a outra pessoa.
Em Bereshit/Gênesis 1:26, Elohim diz: “Façamos o homem à nossa imagem, à nossa semelhança…”. Está a frase no plural, e isto leva à indagação: ao falar “nossa”, com quem o ETERNO está dialogando? Estas são as hipóteses possíveis:
a) Elohim está conversando com os anjos (pensamento de alguns rabinos);
b) o Pai está papeando com o Filho e o Espírito Santo, ou seja, as Três Pessoas estão em cena (tese da Doutrina da Trindade);
c) o ETERNO está se referindo a si próprio no tocante à sua manifestação plural, o que possibilita o emprego do vocábulo “nossa” (ponto de vista da cabalá e que é exemplificado por meio de vários versos no Tanach, o que será estudado posteriormente).
Defrontando-se com o Zohar, o protagonista Shim’on Bar Yochai é questionado por um discípulo:
“Quem disse: ‘Façamos o homem’? [Gn 1:26]
(…)
O rabino Shim’on começou dizendo…
Portanto, a resposta para a pergunta ‘quem disse façamos o homem?’ é Ima (a Mãe) dizendo para Aba (o Pai): ‘Façamos o homem’.” (Zohar, Bereshit A, capítulo 16).
Ou seja, para o Zohar, alegoricamente Elohim “Mãe” diz ao Elohim “Pai” para que o homem fosse feito à imagem e à semelhança dos dois. A união simbólica do Pai (YHWH) e da Mãe (YHWH) gera um Filho, que também tem a mesma essência e é YHWH. Este Filho é chamado de o “Homem Celestial”, e é o “modelo” para a criação de Adam (Adão). O Filho também é denominado de Adam Kadmon, que é o “homem primordial” ou o “homem original”. Explica Gershom Scholem que o ETERNO projeta a si próprio na imagem de Adam Kadmon:
“… Deus entrou na forma de Adam Kadmon…” (Kabbalah, página 116).
“Em Suas manifestações ativas, Deus aparece como a dinâmica unidade das Sefirot, retratadas como a ‘árvore das Sefirot’ ou a mística forma humana (Adam Kadmon), que não é outro senão a ocultada forma de Deus em Si mesmo.” (On The Mystical Shape of the Godhead: Basic Concepts in the Kabbalah, 1991, página 39).
De acordo com a Cabalá, o Homem Celestial (ou Adam Kadmon) não é Adão (o homem terreno), tratando-se, na verdade, de “a primeira emanação formal de Deus”. Por outro lado, o Homem Terrestre é Adão e todos os homens mortais depois dele. Logo, temos as seguintes fórmulas:
1) O Filho = Homem Celestial = Adam Kadmon = primeira emanação formal de YHWH. Isto é, o Filho é a manifestação do próprio ETERNO.
2) Homem Terrestre = Adão = toda a humanidade.
Com estes conceitos em mente, leia-se o Zohar:
“Assim como é o Homem Terrestre, assim é o Homem Celeste interiormente. Pois tudo que acontece aqui embaixo é apenas uma imagem de tudo que acontece em cima. É nesse sentido que compreendemos que Deus criou o Homem à Sua Própria Imagem.
(…)
Já que a forma do Homem compreende tudo o que está nos céus em cima e na terra embaixo, Deus a escolheu como Sua Própria Forma. Nada podia existir antes da geração da forma humana, que também contém todas as coisas. E tudo que existe é pela graça da existência da forma humana. Mas devemos distinguir entre o homem de cima e o homem de baixo, já que um não pode existir sem o outro. Da forma do Homem depende a perfeição da fé. O que nós chamamos Homem Celeste, ou a primeira manifestação divina, é a forma absoluta de tudo que existe, a fonte de todas as formas e ideias: Pensamento Supremo.” (“O Zohar: o Livro do Esplendor”, Polar, 2010, páginas 118 e 119).
Descobre-se, pela citação supra, que o mundo terreno é uma reprodução ou imagem do mundo celestial. Então, Elohim escolhe a forma humana e se manifesta como Homem Celestial. O Homem Terrestre é uma imagem do Homem Celeste (Adam Kadmon), e é neste sentido que está escrito “façamos o homem à nossa imagem” (Gn 1:26). Esta concepção cabalística foi adotada expressamente por Sha’ul (Paulo), aplicando-a a Yeshua:
“Porque, assim como por um homem veio a morte, também por um homem veio a ressurreição dos mortos.
(…)
Também há corpos celestes e corpos terrestres, mas uma é a glória dos celestes e a outra a dos terrestres.
(…)
Assim também está escrito: O primeiro homem, Adam, tornou-se alma vivente; o último Adam, espírito vivificante.
Mas não é o primeiro o espiritual; senão o animal; depois o espiritual”. (Curintayah Álef/1ª Coríntios 15:21,40,45-6)
Sha’ul (Paulo) estabelece a contraposição entre o Homem Terrestre (Adam/Adão) e o Homem Celeste (Yeshua), e conclui:
בַּרנָשָׁא קַדמָיָא עַפרָנָא דּמֵן אַרעָא בַּרנָשָׁא דַּתרֵין מָריָא מֵן שׁמַיָא
Tradução do aramaico de I Co 15:47:
“O primeiro homem, sendo de pó, veio da terra; o segundo homem é YHWH, [que veio] do Céu”.
Note bem que Yeshua é reputado como sendo o Homem Celestial que veio do Céu, que é o próprio YHWH!!! Isto demonstra que Sha’ul estava usando raciocínio parecido com o do autor do Zohar. Ambos valeram-se das mesmas tradições orais cabalísticas provenientes do Judaísmo Antigo.
Para a melhor compreensão destes mistérios, é curial tentar compreender as sefirot do ETERNO.
h) As Dez Sefirot de YHWH
No Zohar, sefirá (plural: sefirot) significa “esfera” ou “luz”. Eis o conceito:
“As dez sefirot são forças ou atributos que emanam do Ein Sof e constituem todos os mundos…” (O Zohar: o Livro do Esplendor, Polar, 2010, página 326).
O Ein Sof (Ser Infinito), incognoscível aos limitados homens, revela-se por meio da emanação das sefirot, conforme giza o cabalista Moshé Cordovero (1522 a 1570 D.C):
“O Infinito, o Rei dos reis, quem governa todos: pela Sua essência penetra e desce via Sefirot e entre as Sefirot…” (Pardes Rimonim, VI, 8, página 38).
Ministra Gershom Scholem:
“O Deus que Se manifesta em Sefirot é o mesmo Deus da crença religiosa tradicional, e consequentemente, apesar de todas as complexidades que tal ideia envolve, a emanação das Sefirot é um processo dentro do Próprio Deus. O Deus oculto no aspecto do Ein-Sof e o Deus manifesto na emanação das Sefirot são um e o mesmo, vistos de dois ângulos diferentes.” (Cabala, A. Koogan editor, 1989, página 89).
De acordo com o Sefer Ietsirá[19], outra antiga obra da Cabalá, existem Dez Sefirot:
“Dez Sefirot do nada,
dez e não nove;
dez e não onze.” (Sefer Ietsirá 1:4).
Eis as Dez Sefirot (atributos/forças) que emanam do ETERNO:
1) Kéter – Coroa (alguns a chamam de Conhecimento = Dáat);
2) Chochmá – Sabedoria;
3) Biná – Entendimento;
4) Chéssed – Graça (literalmente), mas também recebe o sentido de Amor;
5) Guevurá – Força;
6) Tiféret – Glória, Beleza;
7) Nêtsach – Vitória;
8) Hod – Esplendor;
9) Iesod – Fundação;
10) Malchut – Realeza.
De onde os cabalistas tiraram estes dez atributos (sefirot) do ETERNO? Das Sagradas Escrituras. Vejamos.
Existem três atributos (sefirot) principais de YHWH:
“Depois falou YHWH a Moshé [Moisés], dizendo:
(…)
E o enchi da Ruach Elohim [Espírito de Elohim], de Sabedoria, e de Entendimento, e de Conhecimento, em todo o lavor.” (Shemot/Êxodo 31:1 e 3).
“Com a Sabedoria se edifica a casa, e com o Entendimento ela se estabelece;
E pelo Conhecimento se encherão as câmaras com todos os bens preciosos e agradáveis.” (Mishlei/Provérbios 24:3-4)
Além destas Três Sefirot principais (Sabedoria, Entendimento e Conhecimento), chamadas de Três Pilares ou Colunas (Kavim), existem outros Sete atributos (sefirot) do ETERNO. Alguns deles constam expressamente do verso abaixo, estando implícitos os outros pela cláusula “tudo”:
“Tua é, YHWH, a grandeza, e o poder, e a honra, e a glória, e a vitória; porque teu é TUDO quanto há nos céus e na terra; teu é, YHWH, o reino, e tu te exaltaste por cabeça sobre todos.” (Divrei HaYamim Álef/1º Crônicas 29:11)
Yeshayahu (Isaías) menciona as três sefirot principais (Sabedoria, Entendimento e Conhecimento) e ainda se refere à sefirá “força”:
“Porque brotará um rebento do tronco de Yishai [Jessé], e das suas raízes um renovo frutificará.
E repousará sobre ele a Ruach [Espírito] de YHWH, o espírito de Sabedoria e de Entendimento, o espírito de conselho e de Força, o espírito de Conhecimento e o temor de YHWH.” (Yeshayahu/Isaías 11:1-2).
Segundo Arieh Kaplan, assim podem ser compreendidas as Dez Sefirot (atributos/forças) de Elohim:
“As Sefirot são os meios com os quais Deus se comunica com Sua Criação. São também os meios através dos quais o homem se comunica com Deus. Se não fosse pelas Sefirot, Deus, o Ser Infinito, seria absolutamente incognoscível e inatingível. E somente através das Sefirot que Ele pode ser aproximado.” (Sefer Ietsirá, o Livro da Criação, editora Sefer, 2005, página 49).
Para o Sefer Ietsirá, existem cinco sefirot ligadas ao aspecto masculino e cinco relacionadas ao feminino, assim dispostas por Arieh Kaplan (Sefer Ietsirá, o Livro da Criação, editora Sefer, 2005, página 62):
SEFIROT “MASCULINAS” | SEFIROT “FEMININAS” |
Kéter (Coroa) Cochmá (Sabedoria) Chéssed (Graça) Tiféret (Beleza ou Glória) Nêtsach (Vitória) |
Biná (Entendimento) Guevurá (Força) Hod (Esplendor) Iesod (Fundação) Malchut (Realeza) |
Explica o Zohar que a Sefirá Sabedoria/Chochmá (masculina) se une com a Sefirá Entendimento/Biná (feminina), e a união alegórica de ambas gera o Filho de Yah, caracterizado principalmente pela Sefirá Chéssed (Graça):
E outra vez temos macho e fêmea: a Sabedoria é o Pai; a Inteligência, a Mãe. Esses são os dois pratos da Balança. Por causa deles, tudo se manifesta na forma de macho e fêmea. Sem a Sabedoria não haveria começo, já que a Sabedoria é o Pai dos Pais, a origem de todas as coisas. Dessa união a Fé nasce e se espalha no mundo…
Assim, Biná [Inteligência] é realmente Ben Yah, Filho de Deus, o qual é a perfeição de tudo o que existe. Quando o Pai, a Mãe e o Filho (que é a Misericórdia – Chéssed) estão juntos, há a síntese perfeita.
(…)
Mas sabei que isto é a súmula do tema inteiro: tudo no Mundo Inferior foi feito à imagem do Mundo Superior. Todo que existe no Mundo Superior se manifesta aqui embaixo como num retrato. Tudo é uma única e mesma coisa.” (O Zohar: o Livro do Esplendor, Polar, 2010, páginas 115 e 116).
De fato, o homem foi criado à imagem de YHWH (Gn 1:26-2), sendo, pois, a imagem dos atributos invisíveis do ETERNO (Rm 1:20 e Cl 1:15). Já que o homem se une à sua mulher e ambos geram um filho, Elohim é representado, figurativamente, como Pai, Mãe ou Filho, consoante a exposição do Zohar.
Interessante observar que, em Romanos, Sha’ul (Paulo) fala que os homens espelham atributos invisíveis de Elohim e, logo em seguida, combate o homossexualismo e o lesbianismo, que são perversões das características masculinas e femininas implementadas nos seres humanos, criados à imagem de Elohim. Ou seja, gerados mediante a união dos aspectos “masculinos” e “femininos” do ETERNO, explica o Zohar.
Pai, Mãe e Filho são emanações simbólicas de YHWH (e não três “deuses”):
ZOHAR:
“Não há outro Deus fora das dez sefirot, das quais todas as coisas emanam e dependem.
(…)
Ele é Um. E não há nenhum outro.” (Ob.Cit., página 92).
“Pois Deus é o Princípio e Ele é o Fim de todos os graus da Criação.
Ele é o único Ser; apesar das inúmeras formas de que Ele se reveste.” (O Zohar: o Livro do Esplendor, Polar, 2010, página 144).
SEFER IETSIRÁ:
“Dez Sefirot do nada.
Seu fim está contido em seu começo (delas) e seu começo no fim,
como a chama em uma brasa incandescente.
Porque o Mestre é único,
Ele não tem segundo
E antes do Um, o que você conta?” (Sefer Ietsirá 1:7).
A união metafórica de Elohim “Pai” e de Elohim como “Mãe” implica a geração de um Filho simbólico, que sintetiza algumas Sefirot:
PAI | FILHO | MÃE |
3. Biná (Entendimento)
5. Guevurá (Força, Poder, Severidade) 8. Hod (Esplendor, Majestade)
|
1. Kéter (Coroa)
6. Tiféret (Glória, Beleza) 9. Iesod (Fundação) 10. Malchut (Realeza)
|
2.Chochmá (Sabedoria)
4.Chéssed (Graça) 7.Nêtsach (Vitória) |
Vale observar que alguns estudiosos invertem as características do Pai e da Mãe. Na tabela acima, seguimos o modelo do rabino James Trimm (The Middle Pillar: A Jewish Perspective on the Godhead, página 23).
Ainda observando a tabela, identifica-se que o somatório das sefirot do Filho é igual a 26 (1 + 6 + 9 + 10 = 26). O número guemátrico de YHWH (יהוה) também é 26 (10 + 5 + 6 + 5 = 26). Logo, o Filho (26) é YHWH (26).
Aliás, reduzindo-se os nomes hebraicos de YHWH e Yeshua, também chegamos a uma igualdade numérica, que denota a unidade do ETERNO:
a) YHWH (יהוה) = 10 + 5 + 6 + 5 = 26. Reduzindo 26: 2 + 6 = 8.
b) YESHUA (ישוע) = 10 + 300 + 6 + 70 = 386. Reduzindo 386: 3 + 8 + 6 = 17. Reduzindo 17: 1 + 7 = 8.
Destarte, o número final de YHWH (8) é igual ao de YESHUA (8), ratificando-se mais uma vez que Yeshua é YHWH.
Retornando-se à tabela exposta, percebe-se que as Sefirot do Filho estão bem retratadas na B’rit Chadashá:
a) KÉTER (Coroa). Kéter é descrito como a compaixão absoluta e como a fonte celestial dos atributos da misericórdia. Aponta a B’rit Chadashá que Yeshua externava compaixão e exerceu misericórdia, inclusive perdoando pecados, o que é uma prerrogativa exclusiva de YHWH (Mt 20:34; Mc 8:2; Lc 7:13 e 48; Lc 5:20 e Mt 9:5).
b) TIFÉRET (Glória, Beleza). Escreveram os netsarim (nazarenos) que Yeshua possui glória (I Co 2:8; Jo 1:14 e Mt 16:27), outro atributo privativo de YHWH, que não divide a sua glória com ninguém (Is 40:5 e 48:11).
c) YESOD (Fundação). Yesod é o fundamento. Yeshua é o fundamento do Universo, porque “tudo foi criado por ele e para ele” (Cl 1:15-17). Já que o Criador é YHWH (Gn 1:1), fica patente que Yeshua é YHWH.
d) MALCHUT (Realeza). Em Guilyana/Apocalipse, Yeshua é chamado de Rei dos reis e Senhor dos senhores (Ap 19:16), título personalíssimo de YHWH (Dn 2:47 e Dt 10:17).
Além destas Sefirot, o Filho é visto como sendo a emanação do Chéssed (Graça ou Misericórdia):
“… Ben Yah, Filho de Deus, o qual é a perfeição de tudo o que existe. Quando o Pai, a Mãe e o Filho (que é a Misericórdia – Chéssed) estão juntos, há a síntese perfeita.” (O Zohar: o Livro do Esplendor, Polar, 2010, página 116).
No Zohar, o Filho é vislumbrado como a emanação do Chéssed, palavra que significa “graça” ou “misericórdia”. Na B’rit Chadashá, Yochanan (João) associa Yeshua à plenitude da graça:
“E a Palavra se fez carne e habitou entre nós, e vimos a sua glória, como a glória do unigênito que veio do Pai, cheio de graça e verdade.
(…)
E todos nós recebemos também da sua plenitude, com graça sobre graça.
Porque a Torá foi dada por Moshé [Moisés]; a graça e a verdade [já] existiam por Yeshua HaMashiach.” (tradução do aramaico de Yochanan/João 1:14,16 e 17).
Eis um detalhe de extrema relevância: Yochanan escreveu que Yeshua é “cheio de graça e verdade” (Jo 1:14), enquanto o Tanach prescreve que YHWH é “cheio de graça e verdade” (texto em hebraico de Shemot/Êxodo 34:6). Consequentemente, Yeshua é YHWH; e a graça não passou a existir apenas com o nascimento de Yeshua enquanto homem, já que se trata de um atributo eterno de YHWH, que existe antes da criação do Universo.
Ademais, se Yeshua é a emanação de certas sefirot do ETERNO, deduz-se que o Mashiach é YHWH. De fato, na concepção dos antigos cabalistas, as Sefirot são idênticas à substância ou à essência de Elohim:
“A maioria dos primeiros cabalistas primitivos eram mais inclinados a aceitar a visão de que as Sefirot eram na verdade idênticas à substância ou à essência de Deus.
(…).
De acordo com esta visão, as Sefirot não constituem ‘seres intermediários’ mas são o próprio Deus. ‘A Emanação é a Divindade’, enquanto que o Ein-Sof não pode ser objeto de investigação religiosa, que pode conceber Deus apenas em seu aspecto externo. A parte principal do Zohar também tende grandemente a esta opinião, e expressa-se enfaticamente na identidade de Deus intercambiável com Seus Nomes ou Poderes: ‘Ele é Eles, e Eles são Ele’ (Zohar, 3:11b, 70a).” (Cabala, Gershom Scholem, A. Koogan editor, 1989, página 92).
Apliquemos o ensino do Zohar, acima citado, à B’rit Chadashá:
“Ele (YHWH) é Eles (Pai, Filho e Ruach);
e Eles (Pai, Filho e Ruach) são Ele (YHWH)”.
Portanto, restou demonstrado e provado que a Cabalá ensina claramente que o Filho é uma emanação de YHWH (e não outra pessoa), ideia esta que foi adotada pelos netsarim (nazarenos) ao escreverem a B’rit Chadashá.
i) Três Sefarim: Sefer, Sefar e Sipur
De acordo com o Sefer Ietsirá, o Universo foi criado com três livros:
“E [YHWH] criou Seu Universo com três livros (Sefarim):
com Texto (Sefer),
com Número (Sefar)
e com Comunicação (Sipur).” (Sefer Ietsirá 1:1).
E o que isto significa? Ensina o rabino Eliezer HaKalir[20]:
“Quando a Glória criou o mundo, Ele o criou através de três Sefarim [livros], a saber: Sefer [texto], Sefar [número] e Sipur [comunicação], através do qual os três ‘seres’ recebem significado; porque está escrito na história da criação: ‘estas são as gerações dos céus e da terra’, [בהבראם] quando Eles criaram’ [Gn 2:4]. Nossos rabinos de abençoada memória têm exposto que a letra ה na palavra בהבראם (abreviação de HaShem, isto é, YHWH) indica os ‘três seres’, e este é o segredo da Torá, quando diz: ‘No princípio Elohim criou’ [Gn 1:1], e depois ‘No dia em que YHWH Elohim criou a terra e os céus’. O Salmista disse: ‘Pela Palavra de YHWH os céus foram criados, e todo seu exército pelo sopro de sua boca’ [Sl 33:6].
O Rabino, meu professor de abençoada memória, explicou: ‘Sefer, Sefar e Sipur são YAH, YHWH e ELOHIM, significando dizer que o mundo foi criado por estes três nomes’.” (Commentary on Genesis 1:1, Mantra Edition, páginas 28, 29).
Isto é, o mundo foi criado por Sefer, Sefar e Sipur, que são justamente três nomes (YAH, YHWH e ELOHIM) do mesmo ETERNO, que é UM.
Sefer (texto), Sefar (número) e Sipur (comunicação) “representam, respectivamente, qualidade, quantidade e comunicação. Estas são as letras, os números e a maneira como são usadas” (Sefer Ietsirá, Arieh Kaplan, editora Sefer, 2005, página 48).
Texto, número e comunicação estão ligados à Palavra de YHWH, pois o ETERNO criou o mundo por meio de dizeres. Em Bereshit/Gênesis 1, há a narrativa da criação, e diversas vezes consta a cláusula: “Elohim disse”. Ou seja, a Palavra de Elohim é o agente da criação.
Da Palavra emanam sefer (texto = qualidade), sefar (número = quantidade) e sipur (comunicação = modo de usar a qualidade e a quantidade), que estão ligadas às Sefirot do ETERNO, que são “os meios com os quais Deus se comunica com Sua Criação. São também os meios através dos quais o homem se comunica com Deus. Se não fosse pelas Sefirot, Deus, o Ser Infinito, seria absolutamente incognoscível e inatingível. E somente através das Sefirot que Ele pode ser aproximado” (Sefer Ietsirá, Arieh Kaplan, editora Sefer, 2005, página 49).
Em síntese, o mundo foi criado pela Palavra do ETERNO (qualidade, quantidade e comunicação), sendo certo que da Palavra emanam Sefirot, entendidas como os instrumentos com os quais Elohim se comunica com a criação. Logo, a Palavra é uma manifestação do próprio ETERNO por meio das Sefirot, e não outro ser. Segundo Yochanan (João), Yeshua é a Palavra, a emanação do ETERNO (Yochanan/João 1:1 e 14).
Há outro entendimento possível acerca de sefer, sefar e sipur, consoante a pena do rabino James Trimm:
“Ele [Eliezer HaKalir] parece identificar os três SEFARIM do Sefer Ietsirá 1:1b como os três pilares de Deus e a ‘Palavra de YHWH’ como o meio pelo qual o mundo foi criado.
SEFER (texto) Yah (Pilar da Misericórdia)
SEFAR (número) YHWH (Pilar do Meio – o Filho de Yah)
SIPUR Elohim (Pilar da Severidade) comunicação.” (The Middle Pillar: A Jewish Perspective on the Godhead, James Scott Trimm, 2009, página 35).
Dizendo de outro modo: sefer, sefar e sipur seriam três manifestações do ETERNO:
1) SEFER (texto) = Pilar da Misericórdia = Ruach HaKodesh;
2) SEFAR (número) = Pilar do Meio = o Filho de Yah = Yeshua HaMashiach;
3) SIPUR (comunicação) = Pilar da Severidade = Elohim, o Pai.
j) O Pilar do Meio
Explicou-se que YHWH é um ser infinito e que foge à compreensão dos homens, revelando-se a estes por meio de imagens da própria criação, possibilitando que mentes mortais limitadas compreendam, ainda que parcialmente, o incognoscível.
A manifestação simbólica de YHWH como Pai, Mãe e Filho está disposta em Três Colunas verticais, estando o Pai e Mãe nas extremidades e o Filho no meio dos dois. Então, o Filho é conhecido como o Pilar (Coluna) do Meio, síntese das sefirot “masculinas” e “femininas” de Elohim.
Esta ideia de Três Pilares (Colunas) é ensinada pelos três mais importantes livros da Cabalá: Zohar, Bahir e Ietsirá.
O Sefer Ietsirá (Livro da Criação) proclama:
“Vinte e duas letras da Fundação:
Três Mães
Sete Duplas
e Doze Elementares.
As três Mães são Álef, Mem e Shin.
Sua fundação é
um prato da balança do mérito,
um prato da balança da responsabilidade
e a língua do decreto decidindo entre eles.” (Sefer Ietsirá 2:1).
As “Três Mães” são as Três Colunas (Pilares) representativas do Pai (tese), da Mãe (antítese) e do Filho (síntese). Ensina Arieh Kaplan:
“A interpretação mais simples é que Mem é tese, Shin antítese e Álef síntese. Estes três elementos formam então as três colunas verticais nas quais se dividem as sefirot. Mem representa a coluna da direita (encabeçada por Chochmá) [Sabedoria], Shin a da esquerda (encabeçada por Biná) [Entendimento] e Álef a coluna central (encabeçada por Kéter) [Coroa].” (Sefer Ietsirá, o Livro da Criação, editora Sefer, 2005, página 163).
O Sefer Bahir (O Livro do Brilho, da Iluminação) também ajusta as sefirot do ETERNO em três:
“Por que Eles são chamados de sefirot?
Porque está escrito: [Salmo 19:02]
‘Os céus proclamam (me-saprim) a glória de Elohim’.
E quais são Eles?
Eles são Três. Entre eles estão três soldados e três domínios.” (Bahir 125-126).
O Zohar assim trata dos Três Pilares de Elohim (Pai, Mãe e Filho), referindo-se expressamente ao Pilar do Meio (o Filho):
“Então, Elohim disse: ‘Que haja luz, e houve luz’ [Gn 1:3].
E Elohim viu que a luz era boa’… [Gn 1:4].
Por que, pode-se perguntar, era necessário repetir a palavra ‘luz’ neste versículo?
A resposta é que a primeira ‘Luz’ refere-se à primordial luz que é da Mão Direita, e é destinada para o ‘fim dos dias’; enquanto a segunda ‘Luz’ se refere à Mão Esquerda, que emana da Direita.
E as próximas palavras, ‘e Elohim viu que a luz era boa’ [Gn 1:4], referem-se ao Pilar que, em pé e no meio deles, une ambos os lados. E, portanto, quando a unidade dos Três, direita, esquerda e meio, estava completa, ‘era bom’, uma vez que não estaria completo até que o terceiro aparecesse e removesse o conflito entre a Direita e a Esquerda, como está escrito: ‘E Elohim separou a luz das trevas’ [Gn 1:4].
Este é o Pilar do Meio: Ki Tov (que era bom) jogou luz para cima e para baixo e em todos os outros lados, virtude de YHWH, o nome que abrange todos os lados.” (Zohar 1:16 b).
Importante registrar que estas Três luzes referem-se aos Três Pilares (Pai, Mãe e Filho), sendo também conhecidas tais luzes como os três “esplendores” (tsachtsachot). Segundo Gershon Scholem, estas Três Luzes (Esplendores) constituem uma essência e uma raiz do “Infinitamente Escondido” (o ETERNO) e:
“… formam uma espécie de trindade cabalística que antecede a emanação das dez Sefirot…
Na terminologia da Cabalá, estas três luzes são chamadas de tsartsachot (‘esplendores’), e elas são pensadas como raízes das três Sefirot superiores em conformidade com os 13 atributos de Deus.
Não é de surpreender que cristãos mais tarde descobriram uma alusão à sua própria doutrina da trindade nesta teoria, apesar de não conter nenhuma das pessoais hipóstases características da trindade Cristã.” (Kaballah, páginas 95 e 96).
Fica patente que a “trindade” cabalística é diferente da trindade cristã. No Cristianismo, o Pai, o Filho e o Espírito Santo são três diferentes hipóstases (realidades/existências) em uma única divindade, ou seja, são três pessoas distintas e com personalidades também diversas. No Judaísmo cabalístico, as três luzes não são três pessoas, mas sim três emanações do mesmo YHWH.
Com propriedade, ao comentar o “shemá” (Dt 6:4), o Zohar confirma que há três manifestações de 1 (um) YHWH:
“E também aqui ‘YHWH, Eloheinu, YHWH’ são UM.
Três GAUNIN [manifestações/essências] que são UM.
(…)
E esta é a profissão diária [recitação do Shemá] da Unidade que é revelada no mistério do Espírito Santo.
E há muitos GAUNIN que são uma Unidade, e todas elas são verdadeiras, o que um faz o outro faz, e aquilo que um faz o outro faz.” (Zohar, volume II, página 43, Amsterdan Edition).
E em outras seções o Zohar atesta sobre o ETERNO:
“Ele é Um. E não há nenhum outro.” (O Zohar: o Livro do Esplendor, Polar, 2010, página 92).
“Ele é o único Ser; apesar das inúmeras formas de que Ele se reveste.” (Ob.Cit., página 144).
Ministra o cabalista Gershom Scholem sobre a unidade do ETERNO e suas plúrimas emanações:
“Na literatura da Cabala[21] (sic) a unidade de Deus em Suas Sefirot e o aparecimento da pluralidade dentro do Um são expressos através de um grande número de imagens que voltam a acontecer continuamente. São comparados a uma vela que tremeluz no meio de dez espelhos colocados um dentro do outro e cada um de cor diferente. A luz é refletida de maneira diferente em cada um, apesar de ser a mesma e única luz.” (Cabala, A. Koogan editor, 1989, página 94).
Isto é, o ETERNO é Um, mas suas emanações, por meio das sefirot, são diversas, inclusive como o “Filho de Yah”.
Ademais, o Pilar do Meio (o Filho) é chamado de “a Palavra” (Memra) de Elohim, que, de acordo com o Zohar, é uma manifestação do ETERNO:
“E Elohim disse: Façamos o homem” [Gn 1:26]. O segredo de YHWH está para com aqueles que o temem [Sl 25:14].
(…)
Ele [R. Shim’on] começou e disse: certo rei possui uma variedade de construções para serem erigidas; e possui um mestre de obras, que, entretanto, não é permitido fazer nada sem a permissão do rei, como diz: eu estava com ele [Pv 8:30] como um mestre de obras.
O rei é evidentemente a Sabedoria em cima dos céus, e o Pilar do Meio é o rei na terra.
Elohim é o mestre de obras de acima… e Elohim é o mestre de obras abaixo, e esta é a Shechiná na terra.
As obras somente podem vir [a existir] por meio da emanação de Elohim [o Pai].
O Pai fala por meio de sua Palavra [מימרא]… isto é aquilo que é, e imediatamente foi; como está escrito: E Elohim disse: Que haja a luz, e houve luz [Gn 1:3].
O Senhor da Criação ordenou e o mestre de construção fez. Portanto, a emanação de Elohim criou todas as coisas. Ele disse: que haja o firmamento, que haja luz; e imediatamente estes existiram.” (Zohar, Bereshit, página 22, Amsterdan edition).
Na alegoria criada pelo Zohar, o Pai é o rei nos céus; o Pilar do Meio (o Filho) é o rei na terra. O Pai constituiu um mestre de obras para criar todas as coisas que existem no Universo, e este mestre é chamado de “a Palavra”, que é “uma emanação de Elohim (o Pai)”. Assim, dizer que o mundo foi criado pela “Palavra” significa que foi a manifestação do ETERNO quem criou o mundo. Idêntico conceito foi adotado por Yochanan:
“No princípio era A PALAVRA, e A PALAVRA estava com Elohim, e A PALAVRA era ELOHIM”.
“E A PALAVRA (manifestação/essência) se fez carne e habitou entre nós, e vimos a sua glória, a glória do Unigênito (Único) que veio do Pai e que é pleno de graça e verdade.” (Yochanan/João 1:14)
k) o Filho de Yah é Metatron, o Anjo da Aliança
O Pilar do Meio é o Filho de Yah (Filho de YHWH ou Filho de Elohim), também chamado de Metatron (מטטרון):
“Mais vale um vizinho que está perto do que um irmão longe.
Este vizinho é o Pilar do Meio do ETERNO,
que é o Filho de Yah.” (Zohar 2:115).
“O Pilar do Meio [do ETERNO] é Metatron,
Quem tem feito a paz acima,
De acordo com o estado glorioso de lá.” (Zohar 3:227).
“O Santo, Bendito seja, tem um Filho, cuja glória brilha de uma extremidade a outra do mundo.” (Zohar 2:105).
Deriva o nome “Metatron” do aramaico “matara”, que denota o “guarda”, como possível alusão ao Guarda de Yisra’el: “Eis que não dormita e nem dorme o Guarda de Yisra’el” (Tehilim/Salmos 121:4).
Consoantes explicações anteriores, o vocábulo “Filho” não se refere a outro ser, mas tão somente a uma emanação do ETERNO, que representa a união simbólica dos aspectos “masculinos” (Pai) e “femininos” (Mãe) de Elohim:
“Podemos também traduzir ‘aquele que retém as bênçãos do Filho’ [Pv 11:26], cujo Pai e a Mãe têm coroado e abençoado com muitas bênçãos, e sobre quem ordenaram: ‘Beijai o Filho para que ele não fique com raiva’ [Sl 2:12], já que ele é investido com o julgamento (guevurá) e com a misericórdia/graça (chesed).” (Zohar 3:191b).
Nas citações acima do Zohar, o Filho de Yah (Pilar do Meio) é chamado de Metatron. Mas quem é Metatron?
Em Shemot/Êxodo 24:1, afirma-se que:
“[YHWH] disse a Moshé: Subam a YHWH – você, Aharon, Nadav, Avihu e setenta dos líderes de Yisra’el”.
Perceba que YHWH está ordenando Moshé subir a YHWH, quando deveria dizer: “Suba para mim”, e não “Suba a YHWH”. Ou seja, parece que YHWH está determinando Moshé subir a “outro” YHWH. Para explicar esta aparente contradição, o rabino cabalista Bahye ben Asher (R. Bechai), que viveu nos séculos 13 e 14, tornando-se notável pela exegese da Torá, escreveu:
“Elohim disse a Moshé: ‘Suba a YHWH’; este é Metatron, porque este nome implica dois significados, os quais indicam o seu caráter, Ele é Senhor e Mensageiro. E existe uma terceira ideia que implica o nome Metatron: significa o Guarda, porque, na linguagem caldeia, o Guarda é chamado de Materat, e porque Ele é o Guarda do mundo. Ele é chamado de o Guarda de Yisra’el [Sl 121:4]. Pelo significado do Nome dele, nós aprendemos que ele é Senhor de tudo que está abaixo; porque todos os exércitos do céu e todas as coisas na terra foram colocados debaixo de seu poder e força.” (apud The Great Mystery or How Can Three Be One?, Tzvi Nassi, 2010, página 61).
R. Menachem Recanati (1250 a 1310 D.C.), outro famoso estudioso da Cabalá, assim comentou a referida passagem de Shemot/Êxodo 24:1:
“O grande e exaltado Elohim está falando para Moshé. Ele [Elohim] diz que ele [Moshé] deveria subir a YHWH, que é Metatron, que várias vezes é chamado pelo nome de Elohim, aludido como Shechiná, a glória do Senhor, assim é chamado. E a razão pela qual Ele diz ‘Suba’ é como se estivesse dizendo: ascenda para o lugar de glória, onde está o Anjo, o Redentor; porque ninguém pode ir até o grande Elohim; pois [assim está escrito em Ex 33:20]: ‘nenhum homem poderá olhar para Mim e permanecer vivo’.” (Shemot, Venice Edition, página 145).
Então, temos que o Filho de Yah é Metatron (Zohar 2:115), que é o próprio YHWH se manifestando aos homens (R. Bechai e R. Menachem), recebendo ainda o título de “o Anjo” e “o Redentor” (R. Menachem). Todos estes são nomes que designam o Ein Sof.
Aliás, o número guemátrico de Metatron (מטטרון) é 314, que é igual ao de Shadai (שדי), o Todo-Poderoso, asseverando muitos estudiosos que Metatron é Shadai.
Outrossim, Metatron é o Anjo do qual falou YHWH:
“Envio um Anjo à sua frente para guardá-lo no caminho e levá-lo ao lugar que preparei. Preste atenção a ele, ouça o que ele disser e não se rebele contra ele, pois ele não perdoará nenhum erro de sua parte, porque Meu Nome encontra-se nele.” (Shemot/Êxodo 23:20-21).
Ensina R. Bechai que o referido Anjo é uma emanação do ETERNO, e não um anjo criado:
“Este Anjo não é um dos seres criados que podem pecar…
(…)
‘Porque Ele [o Anjo] não perdoará as suas transgressões’. Porque Ele pertence à classe de quem não pode pecar. Ele é Metatron, o Príncipe do Seu semblante [semblante de Elohim].
(…)
… Ele [o Anjo] é o meu único amado.
(…)
Com referência a ser chamado de ‘Anjo’, você deverá saber que ele não pertence à [classe] dos seres criados, porque o mundo é governado por Ele, porque Ele é o ente da justiça.
‘Obedeça à sua voz’. Está alertando para que eles não aborreçam o único integrante da Divindade. Entretanto, imediatamente se acrescenta: ‘não o provoquem’; estas palavras os nossos rabinos de abençoada memória explicaram: ‘Não Me provoque Nele’, porém, tenham em mente que todos são Um, e todos eles são o Memorável, o único e 1 (um) Elohim, que não pode ser dividido.” (apud The Great Mystery or How Can Three Be One?, Tzvi Nassi, 2010, páginas 58 e 59).
Retornando-se ao episódio de Shemot/Êxodo 23:20-21, o preclaro exegeta e rabino Moshé Ben Nachman assim o comenta:
“De acordo com a verdade, este Anjo, prometido aqui, o Anjo, o Redentor, no qual está o grande Nome, porque no Senhor YHWH está um força eterna, a Rocha das Eras. Ele é o mesmo quem disse: ‘Eu sou o Elohim de Beit El’ [Gn 31:13]. As Escrituras o chamam de Anjo, porque Ele é o Embaixador, e nós aprendemos que o mundo é governado através Dele.” (Ob.Cit., página 56).
Disse o ETERNO acerca de seu Anjo: “porque Meu Nome encontra-se nele” (Ex 23:21). Sobre esta assertiva, explicou o rabino Tzvi Nassi (1800 a 1877 D.C.):
“Porque o Seu Nome está Nele significa: a plenitude da Divindade está Nele.” (Ob.Cit., página 56).
E é exatamente isto que Sha’ul (Paulo) escreveu sobre Yeshua:
“Porque nele habita, corporalmente, a plenitude do que Elohim é.” (Colossayah/Colossenses 2:9).
Releva lembrar que, no primeiro encontro que Moshé teve com o ETERNO, quem se revelou na sarça ardente foi o Anjo de YHWH (Shemot/Êxodo 3:2). Mas este Anjo é citado como sendo o próprio YHWH em Shemot/Êxodo 3:4. E, então, há a revelação do Sagrado Nome, YHWH, em Shemot 3:15. Em suma, o Anjo de YHWH é YHWH, e não um anjo criado. Aliás, esta é a conclusão de rabinos do porte de Moshé Ben Nachman e Bechai (Ob.Cit., página 54).
O Anjo de YHWH (= YHWH) é quem firmou a aliança com Moshé no Sinai, sendo, portanto, chamado de Anjo da Aliança. Segundo a profecia de Malachi (Malaquias), o Anjo da Aliança se manifestaria novamente ao povo de Yisra’el:
“Vejam: Envio meu mensageiro para abrir o caminho diante de Mim;
e o Senhor, a quem procuram, chegará de modo repentino a seu templo.
Sim, o Anjo da Aliança, de quem vocês se agradam –
observem: Eis que ele vem, diz YHWH dos Exércitos.” (Malachi/Malaquias 3:1).
Afirmam os escritores da B’rit Chadashá que a profecia sobre a vinda do Anjo da Aliança se cumpriu em Yeshua, sendo Yochanan HaMat’bil (João Batista) o mensageiro que preparou o seu caminho (Mt 11:10; Mc 1:2 e Lc 1:76). À vista disso, Yeshua é o Anjo da Aliança, que é uma manifestação de YHWH.
Se não bastasse, em Ml 3:1, está escrito que o mensageiro prepararia o caminho “diante de Mim”, ou seja, diante de YHWH. Assegura a B’rit Chadashá que o mensageiro (Yochanan) preparou o caminho diante de Yeshua (Mt 11:10). Daí, Yeshua é YHWH.
Atribui o Zohar outro título a Metatron: “o primogênito de todas as criaturas de Elohim” (Zohar 1:129b). Ou seja, YHWH é Metatron, que também é chamado de “o primogênito”. Tal nomenclatura foi adotada pelos netsarim (nazarenos):
“Porque, a qual dos anjos disse jamais: Tu és meu Filho, hoje te gerei? Eu lhe serei por Pai, E ele me será por Filho?
E outra vez, quando introduz no mundo o Primogênito, diz: E todos os anjos de Elohim o adorem.” (Ivrim/Hebreus 1:5-6).
“O qual [Yeshua] é imagem do Elohim invisível, o Primogênito de toda a criação;
Porque nele foram criadas todas as coisas que há nos céus e na terra, visíveis e invisíveis, sejam tronos, sejam dominações, sejam principados, sejam potestades. Tudo foi criado por ele e para ele.
E ele é antes de todas as coisas, e todas as coisas subsistem por ele.
E ele é a cabeça do corpo, da Kehilá; é o princípio e o Primogênito dentre os mortos, para que em tudo tenha a preeminência.” (Colossayah/Colossenses 1:15-18).
Se o título “o Primogênito” pertence a Metatron, que é o ETERNO, torna-se patente que os escritores da B’rit Chadashá o aplicaram a Yeshua pelo fato de crerem que o Mashiach é YHWH.
Na literatura judaica, Metatron exerce a função de Mediador.
Narra a Torá:
“e eles disseram a Moshé [Moisés]: ‘Fale você conosco, e nós ouviremos. Não deixe, porém, Elohim falar conosco, ou morreremos’” (Shemot/Êxodo 20:16; versões cristãs: Ex 20:19).
Serviu Moshé de intermediador entre Elohim e o povo de Yisra’el. Da mesma forma, Metatron (o Filho de Yah) é o único Mediador entre o ETERNO e os homens. Explica o Zohar:
“ ‘Para guardar o caminho da árvore da vida’ [Gn 3:24].
Quem é o Caminho da árvore da vida? É o grandioso Metratron, porque Ele é o Caminho para a grandiosa árvore, para o poder da árvore da vida.
Por isto está escrito: ‘O Anjo de Elohim, que ia à frente do acampamento de Yisra’el, moveu-se e colocou-se atrás deles’ [Ex 14:19].
Metatron é chamado de Anjo de Elohim.
Venha e veja, assim disse R. Shim’on: O Santo, bendito seja Ele, preparou para si um Santo Templo em cima dos céus, e uma Santa Cidade, a Cidade nos céus, que é chamada de Jerusalém, a Santa Cidade.
Toda petição dirigida ao Rei deve ser através de Metatron.
Toda petição e mensagem daqui debaixo primeiramente vai a Metatron, e daí para o Rei.
Metatron é o Mediador de tudo o que vai do céu para a terra, e de tudo que vai da terra para o céu.” (Zohar, volume II, Shemot, página 51, Amsterdan Edition).
Foi adotada a mesma concepção de Mediador pelos netsarim:
“Porque há um só Elohim, e um só Mediador entre Elohim e os homens, Yeshua HaMashiach, homem.” (Timoteus Álef/1ª Timóteo 2:5).
“E a Yeshua, o Mediador de uma Aliança Renovada, e ao sangue da aspersão, que fala melhor do que o de Havel [Abel].” (Ivrim/Hebreus 12:24).
“Disse-lhe Yeshua: Eu sou o caminho, e a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim.” (Yochanan/João 14:6).
“E tudo quanto pedirdes em meu nome eu o farei, para que o Pai seja glorificado no Filho.
Se pedirdes alguma coisa em meu nome, eu o farei.” (Yochanan/João 14:13-14).
De acordo com o Zohar, Metatron, o Filho de Yah, é uma emanação de YHWH, sendo chamado de “o traje” (vestuário, roupa) do Todo-Poderoso:
“O traje do Todo-Poderoso é Metatron.” (Zohar, volume III, página 231, Amsterdan Edition).
Tsvi Nassi (1800 a 1877 D.C), rabino ortodoxo que passou a crer em Yeshua HaMashiach, escreveu:
“Disto resulta que Deus revela a Si próprio na incriada e autoexistente Palavra מימרא יי, que também é chamada de Anjo da Aliança מלאך הברית, que é Metatron מטטרון, que é o Todo-Poderoso שדי revelado em Si mesmo em Metatron מטטרון, o Guarda de Yisra’el.” (Ob. Cit., página 68).
Pode-se, então, resumir a ideia na seguinte fórmula: Yeshua = a Palavra = o Anjo da Aliança = Metatron = o Todo-Poderoso = YHWH.
Este raciocínio é confirmado em outro momento pelo Zohar, ao comentar o seguinte verso bíblico: “Tu és meu Filho, hoje eu te gerei” (Tehilim/Salmos 2:7). Explica o Zohar que este Filho é Metatron, que é YHWH:
“Existe um Homem Perfeito, que é um Anjo. Este Anjo é Metatron, o Guarda de Yisra’el; Ele é o Homem na imagem do Santo, bendito seja Ele, que é uma emanação Dele [do ETERNO]; sim, Ele (Metatron) é YHWH. Sobre Ele não se pode dizer que foi criado, formado ou feito, mas que Ele é uma Emanação de Elohim.” (apud The Great Mystery or How Can Three Be One?, Tzvi Nassi, 2010 página 70).
Ainda segundo o Zohar, o Filho é chamado de Shechiná:
“Elohim disse: Fiel Pastor! Tu és meu Filho, sim, a Shechiná! Ó poderosos, ó Anjos. Beijem o Filho [Sl 2:12]. Todos vocês se levantem e O beijem, e O recebam como Senhor e Rei!” (Zohar, volume III, página 281, Amsterdan Edition).
Se o Filho é identificado como sendo a Shechiná (שכינה), mister se faz definir esta palavra. Conceitua a Jewish Encyclopedia que “Shechiná” é:
“A presença majestosa ou manifestação de Deus que desceu para ‘habitar’ entre os homens. Semelhante à Memra (= ‘palavra’, ‘logos’) e ‘Yekara’ (i.e, ‘Kabod’ = ‘glória’); o termo foi usado pelos rabinos no lugar de ‘Deus’…” (Jewish Encyclopedia, verbete “shekinah”).
Logo, se o Filho é a Shechiná, o Filho é YHWH.
l) Metatron no Talmud
Existiu um rabino chamado Elisha ben Abuyah, nascido um pouco antes do ano 70 D.C., que se tornou uma das grandes autoridades da Torá em Jerusalém. Por razões misteriosas, o referido rabino rompeu relações e abandonou o grupo dos fariseus, apesar de continuar ensinando a Torá e deter em suas mãos livros considerados “proibidos”.
Alguns estudiosos pensam que o rabino Elisha se tornou um nazareno, e por tal razão passou a ser perseguido e denegrido pelos fariseus. Aliás, os livros dos netsarim (nazarenos), que compõem a B’rit Chadashá, eram proibidos pelo judaísmo rabínico e provavelmente podem ter sido usados por Elisha. Somente para exemplificar, há uma parábola ensinada por Elisha que é extremamente parecida com a história narrada em Matityahu/Mateus 7:24-27.
Já que os relatos existentes sobre Elisha ben Abuyah foram escritos por seus inimigos (os fariseus), devem ser vistos com cautela e reserva, porquanto não são dotados de imparcialidade.
Pois bem, relata o Talmud (Chagigah 15a) que Elisha ben Abuyah teve uma visão de Metatron sentado, lá no céu. Já que somente o ETERNO pode ficar assentado em seu trono, conduta que não é permitida a nenhum outro ser, Elisha disse: “Há dois poderes (no céu)”. Explica o Talmud que Metatron recebeu permissão para ficar sentado, pois era o escriba celestial que registrava os bons feitos de Yisra’el. Para provar o ETERNO que Metatron não era uma segunda divindade, o anjo Metatron foi punido com 60 golpes de açoites ardentes.
Analisando o caso citado com a cautela devida, objetivando cortar as deturpações do Talmud, talvez Elisha tenha considerado que Metatron fosse outra emanação do ETERNO, tal como Estevão viu a manifestação plural do Ein Sof nas imagens de Elohim e de Yeshua:
“Mas ele [Estevão], cheio da Ruach Hakodesh, olhou para o céu e viu a shechiná de Elohim, e Yeshua em pé, à direta de Elohim.
‘Prestem atenção’, ele disse. ‘Vejo o céu aberto e o Filho do Homem em pé, à direta de Elohim’.” (Atos 7:55-56).
Se Elisha ben Abuyah se tornou um nazareno, a visão que teve de Metatron (o Filho de Yah) era, em realidade, a de Yeshua. Já que o Talmud foi escrito por aqueles que negaram o Mashiach, então, no episódio mencionado, substituíram o nome de Yeshua por Metatron, e disseram mentirosamente que este recebeu 60 chibatadas.
Em outra história do Talmud, há um debate com um “min” (herege). “Minim” (singular: “min”/herege) é uma expressão para designar os nazarenos, que foram reputados hereges pelo judaísmo rabínico (neste sentido, confira Dictionary of the Targumim, Talmud Bavli, Yerushalmi and Midrashic Literature, de Marcus Jastrow). Infere-se daí que o caso a seguir narrado relaciona-se à discussão dos rabinos com um nazareno:
“Um min [nazareno] disse para o rabino Idit:
Está escrito: Ele [YHWH] disse para Moshé:
‘Suba a YHWH’ [Ex 24:1].
Mas certamente deveria ter declarado: ‘Suba a Mim’.
Este é Metatron’ [quem está falando] replicou [o rabino Idit], cujo nome é similar ao do Mestre, pois está escrito: ‘porque meu nome está nele’ [Ex 23:21].” (Talmud Bavli, Sanhedrin 38b).
Na continuação do diálogo acima, o nazareno (“min”) se vale do seguinte argumento: a) quem está falando em Ex 24:1 é YHWH; b) afirma o rabino Idit que quem está falando é Metatron; c) logo, Metatron é YHWH e, assim, pode ser adorado. Então, o rabino Idit contestou o nazareno alegando que o verso “não sejam rebeldes em relação a ele” (Ex 23:21) deveria ser entendido como “não Me troquem por ele”. Tal raciocínio do rabino Idit não faz sentido, uma vez que altera substancialmente a literalidade do texto de Ex 23:21.
Algumas conclusões são firmadas com base na mencionada discussão talmúdica: a) o “min”, por ser um nazareno, cria que Yeshua é o Mashiach; b) admitiu o nazareno que Metatron é YHWH e que pode ser adorado; c) Metatron significa o Filho de Yah; d) resultado: o nazareno identificou Yeshua como sendo Metratron; já que Metatron é YHWH, consequentemente, Yeshua é YHWH e pode receber adoração.
m) O testemunho de Marcus, o cristão cabalista
No segundo século, viveu um cristão chamado Marcus, que foi fortemente perseguido por seus detratores. Já que a imagem que hoje temos de Marcus provém de seus inimigos, devemos ter prudência em acreditar em tudo o que é dito contra o citado cristão.
Pois bem, apesar de viver em um mundo de língua grega, Marcus escrevia, falava e realizava toda a liturgia cristã em aramaico, alegando que recebeu muitos de seus ensinos de discípulos dos emissários (“apóstolos”), ou seja, dos nazarenos.
Certas lições de Marcus são bem próximas de conceitos da Cabalá, levando o estudioso Gershom Scholem a afirmar que as teorias do cristão têm por base antigas tradições do Judaísmo. Consequentemente, as ministrações de Marcus podem dar pistas acerca do pensamento original dos netsarim.
Ao se analisar os escólios do antigo cristão, verifica-se que diversos conceitos são extremamente semelhantes às tradições cabalísticas do Judaísmo antigo, expostos ao longo deste trabalho.
Lecionava Marcus que o ETERNO é quem gerou todas as coisas e, por isto, era chamado alegoricamente de Pai órfão, isto é, sem pai e sem mãe, já que o Criador não descende de ninguém. Já que o ETERNO era incompreensível à razão humana, revelou-se ao mundo por meio de sua Palavra, Yeshua, que é uma manifestação visível do invisível Criador:
“Quando no princípio, o Pai órfão [YHWH], que não é compreendido pela mente e nem tem substância [física], e nem é homem ou mulher, quis expressar seu inefável ser e fez seu ser invisível visível, Ele abriu sua boca e produziu a Palavra [Yeshua] que se assemelha a si próprio.
Para aproximar-se dele, Ele demonstrou que estava se tornando manifesto consoante a forma do invisível.” (On The Mystical Shape of the Godhead: Basic Concepts in the Kabbalah, Gershom Scholem, 1991, página 25).
Assim, para o cristão Marcus, Yeshua é visto como uma emanação do ETERNO, conceito totalmente compatível com a teologia da Cabalá, que identifica o Pilar do Meio, o Filho de Yah, como sendo a imagem do Ein Sof.
CONCLUSÃO
A tradição oral da Cabalá é muito antiga, e já era usada pelos essênios até mesmo antes da vinda de Yeshua, conforme leciona o preclaro rabino James Trimm.
De acordo com as fontes cabalísticas, o Filho de Elohim é a própria emanação do ETERNO, e não outro ser. Este conceito foi amplamente adotado pelos escritores da B’rit Chadashá (Aliança Renovada/Novo Testamento), não havendo qualquer dúvida de que Yeshua, o Filho de Elohim, é uma manifestação de YHWH.
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[1] O Sefer HaBahir (Livro do Brilho) é um dos mais importantes livros da Cabalá.
[2] Os defensores da autoria de Shim’on Bar Yochai alegam que: 1) Moisés de Leon não poderia ter escrito o Zohar, uma vez que este livro possui estilo literário totalmente diverso de outros livros escritos por Leon; 2) há aparentes referências ao Zohar na literatura judaica antes de Moisés de Leon, inclusive um documento em que Ramban é chamado a examinar o livro, e testemunhas atestam o fato; 3) uma obra da magnitude do Zohar e com grande extensão (1700 páginas) não poderia ter sido escrita em apenas seis anos; 4) além da diferença de estilo entre o Zohar e outros livros de Leon, há ideias conflitantes entre ambos; 5) um antigo manuscrito se refere a um livro que aparenta ser o Zohar.
[3] Em favor da segunda tese, pesa o fato de que, após a morte de Moisés de Leon, homens ricos procuraram a esposa do falecido com o intuito de comprar o manuscrito original do Zohar escrito no século II, ocasião em que a citada esposa confessou que seu marido tinha sido o autor do livro (já no século XIII), e não Shim’on Bar Yochai. Em percuciente análise do tema, o cabalista Gershom Scholem concluiu que Moisés de Leon foi o escritor do Zohar, uma vez que o texto contém gramática e estruturas frasais da língua espanhola. Quanto à “fraude” de Leon, cabe dizer que, em sua época, era comum se atribuir a autoria de livros a rabinos antigos, com o fito de dar mais peso às obras.
[4] Este Ancião é o ETERNO, conforme revela o livro de Dani’el 7:9.
[5] Gaun (singular) ou Gaunin (plural). A palavra denota “essência, manifestação, substância, natureza”.
[6] O Pai não é o Ein Sof, o ETERNO em si, mas tão somente uma de suas emanações.
[7] Espírito de santidade ou Espírito Santo.
[8] “O Evangelho segundo os Hebreus”, escrito em hebraico, é mencionado por vários “Pais” da Igreja, como Eusébio de Cesareia e Jerônimo. Aliás, este último chegou a obter uma cópia deste antigo manuscrito, dizendo que foi escrito em hebraico e era usado plenamente pelos nazarenos. Confira o livro B’sorah HaEv’rim, contendo a cópia do referido Evangelho, reconstruído por James Trimm e publicado pela “The Worldwide Nazarene Assembly of Elohim”. O texto citado, acerca de a Ruach HaKodesh ser tratada metaforicamente como “mãe”, encontra-se no capítulo 4:1, página 34.
[9] No contexto do Zohar, os Três Nomes são três substâncias, essências, emanações.
[10] Refere-se ao hábito de se fechar os olhos nos momentos de oração, para melhor sintonizar-se com o ETERNO.
[11] De acordo com o Sefer Ietsirá, outro antigo livro da Cabalá judaica, o Fogo, o Ar e a Água são os elementos conceituais da criação. O fogo representa a masculinidade; a Água, a feminilidade; o Ar representa o fôlego (ruach; espírito), visto pelos antigos como a união do Fogo (macho) com a Água (fêmea). Confira: “As três Mães [forças criadoras]: Álef, Mem e Shin no Universo são o ar, a água e o fogo. O Céu foi criado do fogo, a Terra foi criada da água e o Ar do Fôlego decide entre eles” (Sefer Ietsirá 3:4).
[12] Vide pensamento similar em I Tm 6:16: “o único que é imortal e habita em luz inacessível, a quem ninguém viu nem pode ver. A ele sejam honra e poder para sempre. Amen”.
[13] Em Sl 110:5, os massoretas substituíram o nome de YHWH por ADONAI (Meu Senhor). Não obstante, no Tanach em aramaico consta corretamente MARYAH, que denota YHWH.
[14] K’numah está no singular; k’numeh, no plural.
[15] Confira outro texto traduzido do aramaico e que fala da k’numah do Filho: “ [Yeshua] que é o esplendor de Sua glória, e a exata imagem de Sua natureza, sustentando tudo pelo poder de Sua Palavra; e pela Sua k’numah [manifestação/natureza/essência] fez a purificação dos pecados, assentando-se ao lado da Majestade nas alturas.” (Ivrim/Hebreus 1:3).
[16] No texto, “misticismo” não tem o sentido pejorativo. Significa a busca por revelações sobrenaturais do ETERNO, crendo que este pode se comunicar com o homem e transmitir sinais e mensagens secretas. Assim, os profetas de Yisra’el praticavam o misticismo, já que receberam inúmeras revelações proféticas de YHWH.
[17] Comentário de Jerônimo sobre Isaías 11:2; apud The Middle Pillar, James Scott Trimm, página 42.
[18] Pelo texto, o ETERNO tem um Rei, que é o Mashiach. Porém, se o ETERNO é tratado nas Escrituras como sendo o Rei (Is 43:15), como poderia estar submetido a “outro” Rei (“Meu Rei”)? Resposta: só existe um Rei, e o Mashiach é uma emanação de YHWH.
[19] “Livro da Criação”. Trata o Sefer Ietsirá das origens do Universo. De acordo com a tradição judaica, Avraham (Abraão) foi o autor da obra, o que é atestado pelo Zohar e Raziel. Todavia, alguns negam a autoria do patriarca, alegando que, se Avraham fosse verdadeiramente o autor, o livro estaria incluído no cânon das Escrituras. Há quem diga ainda que o livro contém alguns ensinamentos de Avraham, mas que foi escrito por outra pessoa em momento bastante posterior. Sobre esta polêmica, confira “Sefer Ietsirá, o Livro da Criação”, de Arieh Kaplan, editora Sefer, 2005, páginas 20 a 28.
[20] Viveu no século VI. Porém, alguns estudiosos afirmam que o citado rabino viveu no século II, sendo identificado como R. Eliezer, filho de Shim’on Bar Yochai, tradicionalmente conhecido como o autor do Zohar.
[21] A pronúncia correta da palavra é Cabalá, e não Cabala.