Foi criado o homem no sexto ou no sétimo dia?

Foi criado o homem no sexto ou no sétimo dia?

Por Tsadok Ben Derech

A pergunta formulada no título deste estudo advém da estranheza causada em algumas pessoas quando leem a Torá. Por quê: Porque a Torá afirma, inicialmente, que o homem foi criado no sexto dia (Gn 1:27 e 31), porém, também declara que “terminou Elohim no dia sétimo a sua obra, que fizera” (Gn 2:2). Em suma, o ETERNO criou o homem e concluiu sua obra no sexto ou no sétimo dia?

A aparente contradição entre os textos causou tanta confusão que escribas passaram a registrar diferentes redações em Gn 2:2. Enquanto o Texto Massorético em Hebraico proclama que “terminou Elohim no dia sétimo a sua obra”, a Septuaginta (Grego), o Tanach Peshitta (Aramaico) e a Torá Samaritana (Hebraico) registram algo diverso, qual seja, que Elohim terminou a sua obra no sexto dia. Expõe-se Gn 2:2 em vários manuscritos:

Texto Massorético:

 וַיְכַ֤ל אֱלֹהִים֙ בַּיּ֣וֹם הַשְּׁבִיעִ֔י מְלַאכְתּ֖וֹ

“E concluiu Deus no dia sétimo a sua obra”.

Septuaginta:

 καὶ συνετέλεσεν ὁ θεὸς ἐν τῇ ἡμέρᾳ τῇ ἕκτῃ τὰ ἔργα αὐτοῦ 

“E completou Deus no sexto dia as suas obras”.

Tanach Peshitta:

ܘܫ݁ܠܡ ܐܠܗܐ ܒܝܘܡܐ ܫܬܝܬܝܐ ܥܒ̈ܕܘܗܝ

“E completou Deus no dia sexto a sua obra”.

Torá Samaritana:

ויכל אלהים ביום הששי מלאכתו

“E concluiu Deus no dia sexto a sua obra”.

À luz da Septuaginta, do Tanach Peshitta e da Torá Samaritana, o homem foi criado no sexto dia e foi também neste dia que o ETERNO concluiu a sua obra (Gn 2:2).

Porém, por que o Texto Massorético declara que o ETERNO criou o homem no sexto dia (Gn 1:27 e 31) e na sequência diverge dos outros manuscritos ao asseverar que a obra de Elohim foi concluída apenas no sétimo dia? (Gn 2:2). Como explicar esta aparente contradição?

Ao comentar o Talmud (Meguilá 9a)Rashi explica que a Septuaginta possui redação diferente do texto em Hebraico de Gn 2:2 em razão de o Rei Ptolomeu, monarca do Egito quem solicitou a tradução da Torá para a Língua Grega (Septuaginta), ter pensado que o verso em questão daria a entender que Deus trabalhou no sétimo dia. Então, para evitar a ambiguidade, solicitou que em Gn 2:2 houvesse a substituição da cláusula “dia sétimo” para “dia sexto”, e assim ficaria clara a ideia de que o ETERNO não trabalhou no sétimo dia, mas descansou. Talvez a mesma razão que motivou o Rei Ptolomeu tenha sido a causa das redações de Gn 2:2 na Torá Samaritana e no Tanach Peshitta, isto é, seus escribas alteraram o verso com o escopo de harmonizar as Escrituras no sentido de que o ETERNO não trabalhou no Shabat.

Contudo, ainda que no Texto Massorético esteja escrito que “concluiu Deus no dia sétimo a sua obra” (Gn 2:2), isto não significa que Deus trabalhou no sétimo dia. Ensinam os sábios de Israel que a expressão “concluiu” não se refere à obra da criação, mas sim à instituição do Shabat, que completou o mundo que previamente necessitava de descanso tranquilo.

No Midrash Rabá há uma discussão sobre o significado de Gn 2:2, e duas opiniões diferentes são esboçadas:

Rabi Shim’on disse: O homem de carne e sangue, que não sabe exatamente seus tempos e seus momentos, deve adicionar a partir do profano para o santo [ou seja, deve adicionar algum tempo ao Shabat]. O Santo, Bendito Seja Ele, que conhece seus tempos e seus momentos com exatidão, entrou nele [no Shabat] dentro da espessura de um fio de cabelo, e isto portanto aparentou como se Ele tivesse completado [sua obra] naquele dia.

Outra explicação: O Shabat veio, e então veio o descanso. A obra foi concluída e finalizada” (Rashi sobre Bereshit Rabá 10:9).

De acordo com a primeira opinião (Rabi Shim’on), o verso de Gn 2:2 significa que aparentemente Deus terminou a sua obra no sétimo dia, mas, em verdade, ele completou a sua obra no sexto dia. Por outro lado, a segunda explicação sustenta que Deus completou sua obra no sétimo dia ao adicionar o elemento do descanso, que não existia previamente.

Gur Arieh explica que Deus completou com o sétimo dia a sua obra, que significa o descanso, a cessação de trabalho, e assim Deus completou e aperfeiçoou sua criação.

Conclusão: independentemente da divergência de redação em Gn 2:2 e das interpretações rabínicas diversas, fato é que todos são uníssonos ao afiançar que o homem foi criado no sexto dia.

 

 

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